Foi publicada a Lei 83/2019, de 3 de setembro, estabelece as bases do direito à habitação e as incumbências e tarefas fundamentais do Estado na efetiva garantia desse direito a todos os cidadãos.

O Estado assume o papel de garante do direito à habitação, através de programas e de uma política de habitação integrada que garantam a existência de uma rede adequada de transportes e de equipamento social. A reabilitação urbana integra a política nacional de habitação e incorpora medidas destinadas à mitigação e adaptação às alterações climáticas, à preservação de solos para funções ecológicas e agrícolas e à conservação da natureza.

A habitação que se encontre, injustificada e continuadamente, durante o prazo definido na lei, sem uso habitacional efetivo, por motivo imputável ao proprietário, é considerada devoluta (não sendo consideradas devolutas as segundas habitações, habitações de emigrantes, de pessoas deslocadas por razões profissionais ou de saúde ou impedidas de usar as habitações por ordem judicial).

Todos têm direito, para si e para a sua família, a uma habitação de dimensão adequada, em condições de higiene e conforto e que preserve a intimidade pessoal e a privacidade familiar. É obrigatória a fiscalização periódica das condições de habitabilidade dos fogos habitacionais públicos, a assegurar por entidade administrativa.

A casa de morada de família é aquela onde, de forma permanente, estável e duradoura, se encontra sediado o centro da vida familiar dos cônjuges ou unidos de facto, merecendo proteção especial por parte da Lei.
As pessoas na situação de sem abrigo têm o direito de indicar como morada postal um local de sua escolha, ainda que nele não pernoitem, desde que autorizado pelo titular dessa morada postal.

Na atribuição de habitação adequada em processos públicos de realojamento em bairros e áreas contíguas, são tidos em conta os laços de vizinhança e comunidade preexistentes.

A Lei estabelece também regras gerais aplicáveis o despejo (procedimento de iniciativa privada ou pública para promover a desocupação forçada de habitações indevida ou ilegalmente ocupadas). O despejo de habitação permanente não se pode realizar no período noturno, salvo em caso de emergência.
O Estado, as regiões autónomas e as autarquias locais não podem promover o despejo administrativo de indivíduos ou famílias vulneráveis sem garantir previamente soluções de realojamento.
Em caso de despejo, é garantido que, desde o início e até ao termo de qualquer tipo de procedimento de despejo, independentemente da sua natureza e motivação, há serviços informativos, meios de ação e de apoio judiciário, aos visados, que não há execução de penhora para satisfação de créditos fiscais ou contributivos, que estão disponíveis serviços públicos de apoio e acompanhamento (quando esteja em causa a casa de morada de família).

Será aprovado o Programa Nacional de Habitação (PNH), proposto pelo Governo e aprovado pela Assembleia da República, que estabelece os objetivos, prioridades, programas e medidas da política nacional de habitação. Ao nível local, é criada a Carta Municipal de Habitação (CMH).

A política de habitação compreende os seguintes instrumentos:
a) Medidas de promoção e gestão da habitação pública;
b) Medidas tributárias e política fiscal;
c) Medidas de apoio financeiro e subsidiação;
d) Medidas legislativas e de regulação.

Estas políticas podem ser concretizadas através, designadamente de:
a) Programas e operações públicas de habitação, reabilitação ou realojamento;
b) Programas de repovoamento de territórios em declínio demográfico;
c) Programas de reconversão de AUGI ou regeneração de núcleos de habitação precária;
d) Programas de cooperação entre o Estado e as autarquias locais para aproveitamento do património imobiliário público inativo;
e) Cedência de terrenos ou imóveis para habitação cooperativa;
f) Cedência de terrenos ou imóveis para arrendamento economicamente acessível,
g) A atribuição de subsídios de habitação dirigidos às camadas populacionais que não consigam aceder ao mercado privado da habitação e podem assumir.

É promovida a regularização patrimonial e cadastral dos solos onde estão implantadas AUGI ou núcleos de habitação precária, quando suscetíveis de reconversão ou regeneração. Nas operações de loteamento e nas operações urbanísticas de impacto relevante, as parcelas destinadas a cedências gratuitas para o domínio privado municipal podem ser afetas a programas públicos de habitação ou realojamento.
O Estado garante a existência de bolsas de habitação pública para apoio à política de habitação. Os fogos das bolsas de habitação pública destinam-se a arrendamento público e são atribuídos por concurso.

O Estado garante o funcionamento regular e transparente do mercado de arrendamento habitacional, descriminando positivamente o arrendamento sem termo ou de longa duração. De entre as medidas que podem ser tomadas contam-se a criação de modalidades de seguros de renda ou mecanismos de garantia mútua alternativos à necessidade de fiador e instrumentos eficazes de defesa dos direitos de senhorios e arrendatários.

O Estado deve também apoiar a aquisição de casa própria, privilegiando embora a habitação produzida pelo setor cooperativo ou que resulte de processos de autoconstrução. A lei estabelece as regras aplicáveis na concessão responsável de crédito à habitação, sendo admitida a dação em cumprimento da dívida, extinguindo as obrigações do devedor independentemente do valor atribuído ao imóvel para esse efeito, desde que tal esteja contratualmente estabelecido.
As pessoas com deficiência beneficiam, nos termos da lei, de acesso a crédito bonificado à habitação.
Os condomínios beneficiam de condições preferenciais para acesso a programas de requalificação e reabilitação urbana, nomeadamente em matéria de conforto térmico e acústico, eficiência energética, acessibilidade para pessoas com mobilidade reduzida e reforço da resiliência sísmica dos imóveis e das habitações.

As associações e organizações de moradores gozam do direito de petição perante as autarquias locais relativamente a todos os assuntos da competência destas que sejam do interesse dos moradores e beneficiam de apoios, nomeadamente, a isenção de custos na respetiva constituição, benefícios fiscais respeitantes à sua atividade, participação nos órgãos consultivos da política de habitação e na elaboração dos correspondentes instrumentos estratégicos.

A reconversão de AUGI e a regeneração de núcleos de habitação precária é uma das dimensões da política de habitação e compete ao Estado criar condições específicas e favoráveis à sua prossecução e enquadramento nos instrumentos de gestão territorial e nos programas de promoção da coesão social e territorial. Os núcleos de habitação precária não passíveis de regeneração e as AUGI não passíveis de reconversão devem ser alvo de medidas extraordinárias e temporárias de melhoria da habitabilidade e do habitat, com garantia de acesso aos serviços mínimos essenciais, até à prossecução do realojamento dos seus moradores.
A presente lei entra em vigor em 1 de outubro de 2019 (com exceção das medidas que tenham impacto orçamental, que apenas se consideram em vigor após a publicação do primeiro orçamento a que esse impacto corresponda).

Alcides Martins, Bandeira, Simões & Associados,
Sociedade de Advogados, SP, RL