Foi publicado o Decreto-Lei 1/2020, de 9 de janeiro, que cria o direito real de habitação duradoura (DHD), pelo qual se faculta a uma ou a mais pessoas singulares o gozo de uma habitação alheia como sua residência permanente por um período vitalício, mediante o pagamento ao respetivo proprietário de uma caução pecuniária e de contrapartidas periódicas.

A habitação deve ser entregue pelo proprietário ao morador com um nível de conservação, certificada por uma avaliação prévia realizada por arquiteto, engenheiro ou engenheiro técnico, com menos de 12 meses.
A habitação deve estar livre de pessoas, ónus e encargos, incluindo outros direitos ou garantias reais, designadamente a hipoteca.
O DHD pode ser hipotecado pelo seu titular para garantir crédito que lhe seja concedido para pagar o valor da caução.

O contrato é celebrado por escritura pública ou por documento particular no qual as assinaturas das partes são presencialmente reconhecidas, sujeito a inscrição no registo predial.

Com a constituição do DHD é prestada pelo morador ao proprietário uma caução pecuniária (que constitui rendimento do proprietário) cujo montante é estabelecido, por acordo entre as partes, entre 10 % e 20 % do valor mediano das vendas por m2 de alojamentos familiares, por freguesia, aplicável em função da localização da habitação e da área constante da respetiva caderneta predial (disponível em INE).

Como contrapartida do DHD, o morador paga ao proprietário uma prestação pecuniária mensal estabelecida por acordo no contrato e uma prestação pecuniária anual correspondente a 5 % da caução inicial, paga através de dedução na caução, a partir do 11.º ano de contrato.

Cabe ao morador, em especial:
a) Utilizar a habitação exclusivamente para sua residência permanente (embora possa utilizar parte da habitação para outro fim, desde que o faça ao abrigo de previsão contratual ou através de autorização prévia escrita do proprietário);
b) Pagar as taxas municipais e entregar ao proprietário do imóvel os montantes relativos ao Imposto Municipal sobre Imóveis;
c) Promover ou permitir a realização das avaliações do estado de conservação da habitação e pagar o respetivo custo;
d) Realizar e suportar o custo das obras de conservação ordinária na habitação (obras de reparação de deteriorações na habitação resultantes do envelhecimento dos materiais e ou do seu desgaste pelo uso normal, incluindo as benfeitorias necessárias a garantir um estado de conservação, no mínimo, médio);
e) Consentir ao proprietário a realização das obras extraordinárias (necessárias à reposição das condições de segurança, salubridade e conforto da habitação por anomalias que não sejam decorrentes do envelhecimento dos materiais e ou do seu desgaste pelo uso normal).

O proprietário pode transmitir a propriedade onerada com o DHD, de forma onerosa ou gratuita, mas, com exceção da hipoteca, não pode constituir outros direitos ou garantias reais sobre a mesma.

No caso de execução de hipoteca constituída sobre o DHD, o proprietário tem opção de compra deste direito, devendo ser citado no âmbito da ação executiva para dizer se pretende ou não exercer essa faculdade, podendo, para o efeito, utilizar o saldo da caução existente à data.

Constituem causas de incumprimento definitivo do DHD o não pagamento, total ou parcial, por qualquer das partes dos montantes devidos à contraparte, após o termo do prazo da interpelação efetuada para o efeito.
No caso do morador, será causa de resolução a reincidência de constituição em mora por parte do morador, com pagamento da dívida antes do termo do prazo referido na alínea anterior, por mais do que três, quatro ou cinco vezes seguidas ou interpoladas, consoante o contrato vigore, respetivamente, há menos de 15 anos, há mais de 15 anos e menos de 30 anos ou há mais de 30 anos.
O proprietário constitui-se em mora se não efetuar o pagamento ao morador do montante correspondente ao saldo da caução, acrescendo uma penalização de 20 % do montante da caução em dívida.

O DHD não é transmissível mortis causa, caducando com a morte do morador.
A habitação deve ser entregue, livre de pessoas, no prazo máximo de três meses a contar da data do ato ou da ocorrência determinante da extinção.

O morador pode renunciar livremente ao DHD através do envio ao proprietário, com uma antecedência mínima de 90 dias, de declaração com assinatura reconhecida presencialmente, instruída com ficha de avaliação da habitação comprovativa de um nível de conservação da mesma, no mínimo, médio.
De contrário, pode o proprietário assegurar a sua realização, a expensas do morador, juntamente com a despesa com as obras que, em função dessa avaliação, sejam necessárias para dotar a habitação do estado de conservação exigido.

A extinção do DHD por renúncia do morador determina a devolução do montante correspondente ao saldo da caução.

O regime está em vigor a partir de 10 de janeiro de 2020.

Alcides Martins, Bandeira, Simões & Associados,
Sociedade de Advogados, SP, RL