Foi publicado o Decreto-Lei 74-A/2017, de 23 de junho, que aprova o regime dos contratos de crédito relativos a imóveis, com vista a assegurar um nível adequado de tutela dos interesses dos consumidores que celebram crédito hipotecário.
Antes da celebração do contrato de crédito, o mutuante deve avaliar a solvabilidade do consumidor, com base em fatores relevantes para verificar a capacidade e propensão para o cumprimento do contrato de crédito, que deve ficar a constar de um documento interno que descreva o método de avaliação da solvabilidade, a manter durante todo o período de vigência do contrato de crédito e nos cinco anos seguintes ao seu termo.
O mutuante não pode resolver ou alterar o contrato de crédito em prejuízo do consumidor com base no facto de a avaliação de solvabilidade ter sido incorretamente efetuada.
A informação a prestar pelos mutuantes deve ser completa, verdadeira, atualizada, clara, objetiva e adequada aos conhecimentos do consumidor individualmente considerado, estando os mesmos obrigados a disponibilizá-la aos consumidores de forma legível, sendo proibida, em especial, qualquer forma de comunicação que possa criar falsas expetativas nos consumidores quanto à disponibilização ou ao custo de um crédito.
As informações normalizadas devem especificar e destacar, de modo claro e conciso, acompanhados de um exemplo concreto sempre que aplicável, designadamente:
a) a indicação de que o contrato de crédito deve ser garantido por hipoteca ou por um direito relativo a um imóvel;
b) A TAN, indicando se é fixa, variável ou uma combinação de ambas, juntamente com a indicação de quaisquer encargos aplicáveis incluídos no custo total do crédito para o consumidor, bem como a TAEG;
c) O montante total do crédito;
d) A duração do contrato de crédito;
e) O montante total imputado ao consumidor.
Ao mutuante está vedado fazer depender a celebração ou renegociação dos contratos abrangidos pelo presente decreto-lei da realização de vendas associadas obrigatórias, com exceção do contrato de abertura de conta e contratação de seguros adequados e relacionados com o crédito.
Em simultâneo com a comunicação da aprovação do contrato de crédito, os mutuantes devem entregar aos consumidores uma ficha de informação normalizada que incorpore as condições do contrato de crédito aprovadas, acompanhada da minuta do contrato de crédito.
O mutuante deve informar o consumidor de que este não pode aceitar a proposta contratual durante os primeiros sete dias.
É ainda imposto aos mutuantes:
a) Que assegurem que as políticas de remuneração dos trabalhadores envolvidos na comercialização de contratos de crédito não incentivam a assunção de risco a um nível de risco superior ao tolerado pelo mutuante, incluindo que eventuais comissões não dependem, direta ou indiretamente, de qualquer aspeto relacionado com os pedidos de crédito aprovados ou contratos de crédito celebrados, designadamente do seu número ou percentagem mensal ou anual por trabalhador, montantes, tipo, taxa aplicável;
b) que assegurem que os seus trabalhadores possuem e mantêm atualizado um nível adequado de conhecimentos e competências.
O consumidor tem o direito de reembolsar antecipadamente, total ou parcialmente, o contrato de crédito, com a respetiva redução do custo total do crédito, correspondente à redução dos juros e dos encargos relativos ao período remanescente do contrato.
O reembolso antecipado total pode ser efetuado em qualquer momento, não podendo o valor da comissão a pagar pelo consumidor ser superior a:
a) 0,5 % a aplicar sobre o capital que é reembolsado, no caso de o reembolso ocorrer num período em que é aplicável o regime de taxa variável;
b) 2 % a aplicar sobre o capital que é reembolsado, no caso de o reembolso ocorrer num período em que é aplicável o regime de taxa fixa.
Em caso de reembolso por motivos de morte, desemprego ou deslocação profissional, não podem ser aplicadas comissões de reembolso antecipado.
Aos mutuantes está vedada a cobrança de qualquer comissão pela análise da renegociação das condições do crédito, nomeadamente do spread ou do prazo de duração do contrato de crédito.
Os mutuantes também não podem agravar os encargos com o crédito cuja finalidade seja financiar a aquisição, realização de obras ou manutenção de direitos de propriedade sobre habitação própria permanente, em caso de renegociação motivada por qualquer uma das seguintes situações:
a) Celebração entre o consumidor e um terceiro de um contrato de arrendamento da totalidade ou parte do imóvel (de que terá que constar a menção expressa a que o imóvel se encontra hipotecado em garantia de um crédito cuja finalidade é financiar a aquisição), na sequência de um dos seguintes eventos:
i) A mudança de local de trabalho do consumidor ou de outro membro do agregado familiar, à exceção dos descendentes, para um local cuja distância do imóvel seja superior a 50 km em linha reta, e que implique a mudança da habitação permanente do agregado familiar;
ii) Situação de desemprego do consumidor ou de outro membro do agregado familiar;
b) Ocorrência superveniente de divórcio, separação judicial de pessoas e bens, dissolução da união de facto ou falecimento de um dos cônjuges, quando o empréstimo fique titulado por um consumidor que comprove que o respetivo agregado familiar tem rendimentos que proporcionam uma taxa de esforço inferior a 55 %, ou, no caso de agregados familiares com dois ou mais dependentes, inferior a 60 %.
Em caso de incumprimento do contrato de crédito pelo consumidor, o mutuante só pode invocar a perda do benefício do prazo ou a resolução do contrato se cumulativamente ocorrerem as circunstâncias seguintes:
a) A falta de pagamento de três prestações sucessivas;
b) A concessão, pelo mutuante, de um prazo suplementar mínimo de 30 dias para que o consumidor proceda ao pagamento das prestações em atraso, com a expressa advertência dos efeitos da perda do benefício do prazo ou da resolução do contrato, sem que este o faça.
O incumprimento parcial da prestação não é considerado para os efeitos previstos no número anterior, desde que o consumidor proceda ao pagamento do montante em falta e dos juros de mora eventualmente devidos até ao momento da prestação seguinte.
O consumidor tem direito à retoma do contrato no prazo para a oposição à execução relativa a créditos à habitação ou até à venda executiva do imóvel sobre o qual incide a hipoteca, caso não tenha havido lugar a reclamação de créditos por outros credores, e desde que se verifique o pagamento das prestações vencidas e não pagas, bem como os juros de mora e as despesas em que o mutuante tenha incorrido, quando documentalmente justificadas.
Caso o consumidor exerça o direito à retoma do contrato, considera-se sem efeito a sua resolução, mantendo-se o contrato de crédito em vigor nos exatos termos e condições iniciais.
O mutuante apenas está obrigado a aceitar a retoma do contrato duas vezes durante a respetiva vigência.
O consumidor não pode renunciar aos direitos que lhe são conferidos por força das disposições do presente decreto-lei, sendo nula qualquer convenção que os exclua ou restrinja.
O presente decreto-lei entra em vigor no dia 1 de janeiro de 2018.
Alcides Martins, Bandeira, Simões & Associados,
Sociedade de Advogados, SP, RL