Foi publicado o Acórdão do Tribunal Constitucional com o número 557/2018, no passado dia 14 de novembro, que declara, com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade do artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, na interpretação que lhe seja dada de que a declaração de insolvência suspende o prazo prescricional das dívidas tributáveis quanto ao devedor subsidiário, no âmbito do processo tributário.
O artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas prevê precisamente que todos os prazos de prescrição e caducidade que sejam oponíveis pelo devedor – entenda-se, pelo insolvente – ficam suspensos durante o curso do processo.
Apesar de tal previsão constituir uma redução das garantias do devedor, que deixa de poder invocar ou fica limitado nessa invocação, um meio importante de defesa – a verificação da prescrição ou da caducidade –, pode compreender-se que assim seja. Sendo o processo de insolvência o meio próprio para todos os credores reclamarem os seus créditos e procurarem aí obter a sua satisfação, estando impedidos inclusivamente de procurarem obter o pagamento que seja devido fora desse âmbito, têm todos que ser colocados em condições de igualdade (princípio, aliás, essencial do processo falimentar). Os prazos de prescrição ou caducidade que estejam em curso têm por isso que ser tornados irrelevantes para todos os credores igualmente.
A questão controversa estava na transposição de tal suspensão para a esfera jurídica do devedor subsidiário e para os seus meios de defesa.
Com base, sobretudo, nos argumentos de que a Lei – artigo 100.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas – não distingue entre devedores (principais e subsidiários) e no facto de as causas de suspensão ou interrupção da prescrição aproveitarem igualmente ao devedor principal e subsidiários (conforme consta do artigo 48-º/2 da Lei Geral Tributária), alguns Tribunais vinham decidindo que a suspensão prevista nesse artigo 100.º era aplicável também ao devedor subsidiário, quanto a dívidas tributárias.
Daí resultava que o devedor subsidiário, que (e aludindo às insolvências de pessoas coletivas), não é parte no processo de insolvência, e que, para mais, pode ser demandado ainda enquanto o processo de insolvência está em curso – e com frequência, é – não poderia sequer invocar em sua defesa o curso do tempo, que estaria suspenso, para esse efeito, enquanto estivessem em curso o processo.
Ora, a duração média dos processos de insolvência, no ano de 2017 e tendo por base a informação estatística disponibilizada pela Direção da Política de Justiça, foi fixada em 48 meses.
Ainda que o entendimento do Tribunal Constitucional seja o de considerar esta interpretação contrária à Constituição porque a alteração que a permite foi aprovada pelo Governo (e não pela Assembleia da República, que teria competência orgânica para aprovar a limitação dos meios de defesa dos contribuintes), é uma decisão no sentido certo, repondo algum equilíbrio entre os meios de atuação da exequente nos processos tributários e os meios de defesa do devedor subsidiário.
Poderá este agora, ao menos, contar com um prazo único de prescrição e caducidade das obrigações que sobre ele possam impender por resvalarem do sujeito passivo, cuja interrupção ou suspensão dependem apenas da sua atuação, sendo por si conhecidas e controladas. A interrupção ou suspensão a ocorrer serão, ao menos, voluntárias.
in Vida Económica, 30 de novembro de 2018
Susana Amaral Ramos
Advogada de Alcides Martins, Bandeira, Simões & Associados –
Sociedade de Advogados, SP, RL