Foi publicada a Lei 8/2018, de 2 de março, que cria o regime extrajudicial de recuperação de empresas (RERE).
O RERE, de adesão livre, regula os termos e os efeitos das negociações e do acordo de reestruturação que seja alcançado entre um devedor e um ou mais dos seus credores.
Deve o devedor e credores que representem pelo menos 15% do passivo (percentagem certificada por um TOC ou ROC) assinar um protocolo de negociação e promover o seu depósito na Conservatória do Registo Comercial. O prazo das negociações não pode exceder três meses contados desde a data do referido depósito, podendo qualquer credor aderir ao plano enquanto ele decorre.
A AT e os trabalhadores são, obrigatoriamente, informados do depósito do protocolo de negociação e do seu conteúdo, sempre que sejam titulares de créditos sobre o devedor, sob pena de nulidade. Estas entidades participam obrigatoriamente nas negociações, mesmo que não subscrevam o protocolo de negociação.
A todo o tempo o devedor pode comunicar o termo das negociações, devendo comunicá-lo a todos os credores e proceder ao seu depósito junto da Conservatória. Os credores apenas podem resolver o protocolo com fundamento em incumprimento, não podendo desvincular-se dos compromissos aí assumidos antes de decorrido o prazo máximo previsto para as negociações, ainda que possam cessar a participação ativa nas mesmas.
O conteúdo do protocolo de negociação é estabelecido livremente entre as partes, mas deve conter pelo menos:
a) Identificação completa do devedor, dos credores participantes, dos representantes do devedor e dos representantes dos credores para efeitos do RERE;
b) prazo máximo para as negociações, sem prejuízo do limite legal fixado;
c) Passivo total do devedor (com identificação do nome de todos os credores, proveniência, montante e natureza dos créditos, e garantias associadas);
d) Responsabilidade pelos custos inerentes ao processo negocial, incluindo o custo com a assessoria técnica, financeira e legal, e modo de repartição dos mesmos;
e) Acordo relativo à não instauração pelas partes de processos judiciais de natureza executiva, de processos judiciais que visem privar o devedor da livre disposição dos seus bens ou direitos, bem como de processo relativo à declaração da insolvência do devedor;
f) Data e assinaturas reconhecidas;
g) cópia da certidão do registo comercial do devedor e estatutos;
h) Documentos de prestação de contas do devedor dos três últimos exercícios;
i) Lista de todos os processos judiciais e arbitrais nos quais o devedor seja parte (podendo ser fixado pelas partes o efeito que o protocolo tem no curso desses processos, e devendo o conservador do registo comercial informar do respetivo depósito os tribunais onde se encontrem pendentes os processos judiciais identificados).
Após o depósito do protocolo de negociação, o devedor fica obrigado a manter o curso normal do seu negócio e a não praticar atos de especial relevo, exceto se previstos no protocolo ou se previamente autorizados por todos os credores, diretamente ou através do comité de credores.
O devedor pode solicitar, no decurso das negociações, a nomeação de um mediador de recuperação de empresas. Os credores, por sua vez, podem designar um credor líder ou acordar na nomeação de um comité de credores.
O devedor, em articulação com o credor líder, os assessores (se existirem), o mediador de recuperação de empresas (se houver sido nomeado), deve elaborar e apresentar aos credores o diagnóstico económico-financeiro do devedor.
O conteúdo do acordo de reestruturação é fixado livremente pelas partes, devendo fixar os termos da reestruturação da atividade económica do devedor, do seu passivo, da sua estrutura legal, dos novos financiamentos a conceder ao devedor e das novas garantias a prestar por este.
O acordo de reestruturação produz efeitos entre o devedor e cada um dos credores após o depósito previsto.
O acordo de reestruturação confere às partes benefícios em sede de IRS, ISelo e IMT (tal como previstos no Código da Insolvência e da Recuperação das Empresas), desde que compreenda a reestruturação de créditos correspondentes a, pelo menos, 30 % do total do passivo não subordinado do devedor (ou com autorização expressa da AT no caso de a percentagem ser inferior).
É revogado o SIREVE (anterior Sistema de Recuperação de Empresas por Via Extrajudicial) podendo ser concluídos os que estiverem ainda em curso.
O regime aprovado está em vigor desde 3 de março de 2018.
Alcides Martins, Bandeira, Simões & Associados,
Sociedade de Advogados, SP, RL